Por um outro papo de universitário! Mais NÓS, menos EU...

...essa é a melhor forma para começar a debater sobre os “ensinamentos” da organização “PAPO DE UNIVERSITÁRIO”.

Hoje vivemos a beira da falta de relações humanas, estamos vivendo um colapso de coletividade, construindo um sistema que nos liga através de máquinas, onde a velha e boa conversa já não parece tão interessante, quer dizer, se for no Facebook, aí sim, fica boa.

Apesar de parecer humorístico, essa é a mais pura verdade, e o que não falta são pessoas pra nos ensinar que tudo está dentro de si mesmo, a sua força é igual a do super-homem, basta invocá-la e você mudará a “educação” do mundo, mesmo que não entenda nada de educação, mas, você será capaz, é só fechar os olhos para tudo que está lá fora que você conseguirá, porque o sistema, as outras pessoas, as mazelas sociais, o ambiente, etc., não tem relação nenhuma com o seu sucesso ou o seu fracasso, para o bem ou para o mal, a culpa é sua!

Vejamos alguns dos ensinamentos do PAPO DE UNIVERSITÁRIO que poderá transformar a sua vida, pelo menos até o dia que você precisar de alguém por perto e não tiver mais ninguém, porque na lógica que discutiremos, você vai aproveitar-se de todo mundo, e como disse Zigmunt Bauman “assim como jogamos fora um telefone celular que não nos serve mais, corremos o risco de fazer o mesmo com as pessoas”, de modo que você até será popular, mas, não será confiável, você vai querer me jogar fora, talvez, antes mesmo do seu celular que não serve mais.

1) EU QUERO MUDAR O BRASIL” – mas eu não posso porque é igual ao TCC, tenho que delimitar, então “EU QUERO MUDAR A EDUCAÇÃO DO BRASIL”. E Assim começa a conversa, onde apesar de ser um super-homem, eu não posso mudar muita coisa, ainda que eu construa um rede com mais de 300 seguidores, que o meu Facebook ultrapasse barreiras inimagináveis, mesmo que eu saia por todo o país dizendo que você também é o super-homem, e que eu consiga mais discípulos que Jesus Cristo, não conseguirei mudar o Brasil. Mas, sabem porque não é possível mudar o Brasil na lógica do Papo de Universitário, porque é só PAPO! Se todo o potencial que é dito que nós temos fosse posto em prática numa perspectiva coletiva, certamente a gente mudava até a lua de lugar, mas, só nos disseram que a nossa mega rede de contatos será apenas para extrairmos as oportunidades que nos interessam, o outro que procure as suas. E para que não digam que a educação não foi contextualizada, já que é a missão do PDU, fizeram Paulo Freire se remexer, como veremos no próximo ponto.

2) O CAMINHO SE FAZ CAMINHANDO - A frase foi atribuída a Freire pelo PAPO de Universitário, por achar bonita, fez uso para dizer que você tem que seguir em frente (sozinho), aprendendo com os seus erros e fracassos, em busca do sucesso, de oportunidades, aproveitando tudo o que puder para conquistar o que deseja (sozinho), até que construa o seu “império”. (na lógica apresentada você vai passar a explorar inevitavelmente as outras pessoas). Já PAULO FREIRE, junto com Myles Horton, utilizaram a frase acima para intitular o livro “O Caminho Se Faz Caminhando – Conversas Sobre Educação e Mudança Social”. Dentro do contexto discutido, é no mínimo contraditório utilizar Freire em duas perspectivas defendidas pelo Papo: 1) é você e mais ninguém; 2) entre no caminho oferecido pelo capitalismo, e descubra o brilho nos olhos. E há contradição porque os autores apontam para outra perspectiva, essencialmente para a liberdade das pessoas diante de um sistema avassalador, bem como a partir de se libertarem alcançar a emancipação, e isso se dará na medida em que estejamos libertos da alienação capitalista, para assim, nos emanciparmos derrotando o capitalismo. Por isso que para Freire, a educação é um instrumento de libertação, e não de exploração. Na filosia freiriana, o coletivo é parte elementar. Portanto, mesmo distorcido, falou-se em educação, pena que Paulo Freire foi citado apenas numa frase “bonita”, fora de lugar (sugiro uma boa leitura da obra de Freire)!

3) Voltando lá no começo onde o PDU diz que não pode mudar o Brasil, observamos mais uma contradição, desta vez no ensinamento da receita da popularidade, cujo exemplo utilizado é o do LULA. Ora, como é que eu não posso mudar nada, e o Lula que morava lá em caetés, interior de Garanhuns, em uma situação de miséria chegou tão longe? A resposta é simples: COLETIVO. Enquanto o papo ensina você a seguir sozinho, sentando no fundão para gerar oportunidade, e depois na frente para gerar mais oportunidades, e achando pouco, ensina a sair de sala em sala procurando mais oportunidades em novos supostos amigos, o LULA aprendeu em outra escola, a da fraternidade. Aprendeu que tem que compartilhar ensinamentos, assim como Freire, e unificar as forças, assim como Marx, pois só desta forma se cria um sujeito coletivo, uma grande massa disposta a mudar o mundo, como fez Lenin na Rússia, e, portanto, chegou tão longe. Mas, diferente do PAPO, pôs a sua experiência e determinação a disposição dos oprimidos do mundo, agora está ajudando a mudar a África, já que por ser um sujeito coletivo, deixou outras pessoas mudando o Brasil. A lição que fica: É claro que eu posso mudar o mundo, se deixar inverto até a ordem dos planetas, basta que eu não esteja só e olhe ao meu redor, que seja capaz de enxergar o mundo e a sua realidade.

4) Mas, o PDU foi mais profundo, você já aprendeu a aproveitar-se do seu colega, transformando-o em trampolim. Agora, aprenderá a aproveitar-se do seu professor. Mesmo que você não goste dele, finja, elogie, dê presentes, não reclame, lhe dê razão, principalmente se o professor for “O CARA”, porque sendo esse sujeito fantástico, vai lhe proporcionar espaços fantásticos, que poderá lhe render salários fantásticos, status fantástico, até um dia você chegar lá no fantástico ou dizer “Bom Dia Pernambuco”, e se achar também o “cara”. Bom, nessa fase você já vai tá lambendo as botas de outra pessoa, para chegar um pouco mais longe, até porque, o que foi ensinado é que “você pode tudo sozinho”, mas, terá que aproveitar-se das portas que os outros abrirão, porque sozinho (isso é uma contradição?) você não tem tantas portas para abrir. Para tornar pior o que já tava ruim, o PDU diz pra você não esperar do professor o ensinamento da receita da fortuna, ele não o dará, não vai ensinar você a ficar rico, porque o professor (quanto egoismo professor) não quer concorrentes. Pergunto: se o professor queria ficar rico, ganhar muito dinheiro, passar por cima de todo mundo e do mundo todo, por que diabos foi ser professor?

5) Por fim, recebi o golpe de misericórdia. Bateram na minha nuca com uma tora de madeira que não deu tempo nem derramar a última lágrima de dor. Falaram do DA e DCE como forma de se dar bem...

Durante alguns anos da minha vida, dediquei-me ao movimento estudantil, fui de Centro Acadêmico, Diretório Acadêmico, Diretório Central dos Estudantes, União dos Estudantes de Pernambuco, etc. Ao longo desses anos, aprendi que o Movimento Estudantil luta pelo direito dos Estudantes, por uma educação de qualidade, por um mundo mais justo e, consequentemente por uma formação que contribua com a melhoria de vida das pessoas.

Quando entrei no Movimento Estudantil, me mostraram logo o retrato da ditadura, quantos estudantes foram assassinados por lutarem para que hoje eu escrevesse esse texto, para que o Marcos Rodrigues vendesse o seu peixe, para que você escolhesse o caminho a seguir, para que a UAST existisse, para que o Simpósio pudesse oferecer oportunidade de debate, inclusive apontando o contraditório. E foi nessa escola que me formei.

- Sabe o professor que tá complicando a vida da turma, aquele projetor quebrado, as obras inacabadas, disciplinas sem docente, falta de laboratórios, etc.?
- Deixe que essa briga é do DA, vamos lutar por esses direitos.
Mas, quem é o DA, é Fulano?
-Não, o DA é um sujeito coletivo, que tem diretoria coletiva, que representa todos os estudantes e, que todos os estudantes por sua vez são o próprio DA.

Ora, mas, se o DA é isso, porque alguém utilizaria o DA para fazer dele um trampolim pessoal?
Se um sujeito assumir o DA para se beneficiar, quem vai lutar pelos meus direitos?

São essas perguntas que devemos nos fazer para debater a essência do Papo de Universitário, respeitando a liberdade de escolha de cada sujeito, mas, também fazendo uso dela para contestar o que julgarmos relevante.

Não tenho o interesse em condenar a iniciativa do PDU (não sou juiz), tenho necessidade de criticar a reprodução de uma sistema que nos direciona cada vez mais para longe uns dos outros, e busquei demonstrar nesse texto que todos os sucessos apresentados pelo palestrante do PAPO, foram frutos de experiencias coletivas, e ainda que na lógica dele, as nossas relações sejam apenas forjadas no interesse individual, foram utilizadas de ferramentas coletivas, haja vista que para alcançar um objetivo, foi utilizada a porta aberta por outra pessoa.

Portanto, não basta descobrir que você é o super-homem, tampouco ignorar a força que lhe é dada, que vem de fora (talvez da criptonita) e não de dentro necessariamente. Da mesma forma, saber que tem mais gente que luta ao seu lado (quem sabe a liga da justiça), e que se a sua lógica for de apenas usar do que as pessoas podem lhe oferecer, sem que exista uma relação de troca, de fraternidade, de coletivo, de melhorar o mundo para que dentro dele você viva melhor, e não melhorar você e o mundo que se dane, poderá acabar sozinho e, provavelmente até a liga da justiça lhe faltará.

Resumidamente é isso. O que eu vim fazer no mundo foi alterar a ordem hoje estabelecida, por que o meu papo é outro, e o faço voluntariamente. De repente a gente cria uma nova rede: PAPO DE GENTE, cujo a única regra será pautar-se na realidade. De repente nem teremos tantos “AMIGOS” no Facebook, mas, as nossas rodas de conversa estarão lotadas de gente, com sangue pulsando nas veias, dizendo em alto e bom som, NÓS PODEMOS, pois como diz o poeta Chico Buarque de Holanda:

Todos juntos somos fortes,
somos flecha e somos arco,
todos nós no mesmo barco,
não há nada pra temer.”